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9 de outubro de 2010 —

O inimigo é o sistema

tropadeelite2Fui assistir “Tropa de elite 2 – o inimigo agora é outro” meio ao acaso. Confesso que o primeiro, a princípio, me desagradou – me pareceu uma reprodução estúpida do discurso conservador. Comentários de amigos, como “veja bem, é muito bem feito” e “é a versão do policial bitolado”, me fizeram repensar. Contudo, nunca consegui chegar a uma conclusão sobre o filme em si (o que realmente me irritou foi a elevação do capitão Nascimento a herói pelo público, a manifestação em massa dos preconceitos solidificados em forma de “higienização social”).

Entrei no cinema com aquele espírito de “vou tirar minha própria conclusão dessa polêmica”. E, a cada cena, o filme foi me surpreendendo, ao mostrar claramente a narrativa do protagonista ser desconstruída.

Logo no início, capitão Nascimento zoa os “intelectuais de esquerda”, define-os como os principais inimigos do seu trabalho: combater a bandidagem. Contudo, por uma ação do seu batalhão que teve má repercussão na mídia, ele perde o posto de chefia do BOPE – estratégia do governador para sair limpo da polêmica – e assume uma posição de chefia no serviço de inteligência do estado.

A partir daí o capitão sai do combate cotidiano corpo-a-corpo e passa a conhecer o universo de onde partem as ordens, e os interesses que as geram. A triangulação esfera política – mídia – ações da segurança pública é muito bem explorada, e Nascimento percebe o quão sem sentido era sua guerra nos morros. Ele descobre que os maiores bandidos não são aqueles que ele perseguia. Os maiores bandidos são aqueles que lhe dão ordens, do alto de seus cargos políticos, e seus colegas corruptos de profissão. O inimigo não tem um só rosto, ele está na maneira como as coisas se dão. O inimigo é o sistema.

A evolução da personagem é maravilhosa: a trama explode como um chute na cara, um soco no estômago. A plateia do cinema, ao menos a parte barulhenta, começou o filme vibrando nas cenas de violência física. O rapaz ao meu lado concordava com toda a lógica do capitão Nascimento: “esse cara dos direitos humanos é um idiota mesmo”, disse. Eu tive que dar umas bufadas em alguns momentos, confesso. Comentarista de cinema já é foda; comentarista ogroboy então… Mas no decorrer do filme, depois que o ex-capitão condena o que ele próprio fazia e se alia ao político de esquerda para denunciar o sistema, fiquei me perguntando o que esse povo, que antes vibrava com o caveirão, estava achando dessa mudança de perspectiva. Se, assim como o protagonista, estava revendo a maneira reducionista de pensar as coisas.

Fiquei muito feliz com o debate que o filme incita, a forma complexa pela qual a situação da violência urbana é demonstrada. No final da exibição, tímidas palmas soaram na sala. Confesso que fiquei com vontade de aplaudir, mas meu comportamento tipicamente sulista condicionou uma auto-inibição. Aplaudo aqui, simbolicamente, neste blog.

Agora quero ver se a continuação terá o mesmo impacto e repercussão do seu antecessor. Tomara que sim!

E para quem quiser saber mais sobre o filme, sob um enfoque menos pessoal, vale ler essa resenha.

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